sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Berrar por Sónia M. Santos, Revista Pais & Filhos

Hoje ao ler este artigo no Facebook deu-me vontade de rir, PRINCIPALMENTE PELAS SEGUINTES RAZÕES:
1. porque também sou mãe de 3 filhos;
2. porque quase diariamente apetece-me dizer umas verdades a algumas mentes iluminadas quando começam: "se está a chorar é porque tem fome", "vão ser dentes", "a roupa está apertada", "está pouco confortável", etc etc etc... Isto para não ficar aqui o resto do dia, pois Mãe de 3 filhos tem muita mais coisas para fazer ;)

Artigo escrito por Sónia M. Santos, para a Revista Pais & Filhos:

BERRAR

"Agora que tenho três filhos é que percebo como pode ser desesperante ter o primeiro. Porquê? Por causa das teorias dos outros.


Tenho os gritos dela dentro dos meus ouvidos, dentro da minha cabeça, tão dentro de mim que às vezes já nem sei se é mesmo ela que continua a gritar ou é só o eco que teima em persistir. Há alturas em que até o amor materno consegue ser posto em causa. São apenas momentos, instantes, mas existem e sou menina para desmentir categoricamente quem, tendo uma gritadora de categoria como esta, venha aqui negar, dizer «eu cá não, nunca tive vontade de sair de casa, de bater com a porta, tudo para não ouvir tanto berro descontrolado». O tanas é que não! (a menos, claro está, que se trate de algum cidadão masoquista, que os há, e merecem todo o nosso respeito e consideração).
A Madalena começa a parecer-se perigosamente com o meu primeiro filho. O Manel chorava tanto, guinchava tanto, tanto, tanto que até a PAIS & Filhos me entrevistou, na altura, para falar sobre aquilo que designaram por “bebés coléricos”, daqueles que barafustam sem se perceber muito bem a razão. Foi um drama. Um drama sobretudo porque era o primeiro filho e, por isso mesmo, juntava-se o desejo de fazer tudo bem com o medo de estar a fazer tudo mal. Um verdadeiro teste à sanidade mental e, sobretudo, um verdadeiro incentivo ao controle da natalidade. Não fora a memória ser curta e seríamos hoje pais de um belo filho único. A diferença entre o primeiro filho e o terceiro é a descontracção. Sim, os gritos enervam, sim, os gritos cansam, mas a gente sabe que faz parte e não entra em neurose a achar que a criatura tem de certeza uma doença grave que a vai levar desta para melhor daqui a dez minutos. Isso ou que somos a pior das mães e que, se fosse outra, já sabia de cor o que fazer e já teria calado o bebé em três tempos. Qual quê? A melhor coisa do mundo é ter três filhos, também por isso. Vem este e aquele com as suas teorias e a gente ou não ouve ou desata a rir.
Agora que tenho três filhos é que percebo como pode ser desesperante ter o primeiro. Porquê? Por causa das teorias dos outros. Senão vejamos: uma visita chega a casa de uma mãe recente com um bebé que grita e diz, do alto da sua sabedoria: «Coitadinho, tem fominha…» Se a mãe responder que a criança comeu como uma alarve dez minutos antes, a visita dirá a segunda enormidade do dia: «Se calhar o teu leite é fraco». Em apenas duas frases, a mãe sente-se um farrapo. A culpa do choro é, como tinha imaginado, sua. E isto há-de repetir-se até terminarem todas as visitas. Desde as próprias avós à restante família e amigos, praticamente todos aventarão que o choro da criança tem que ver com fome, e muitos suspeitarão que o seu leite é fraco.
Mas há muito mais teorias para explicar o choro incessante de um bebé: tem sede, tem cocó, tem chichi, tem cólicas, tem sono, está muito calor, está muito frio, quer a chucha, não quer a chucha, precisa de colo, tem colo a mais, precisa é de arrotar, tem roupa a mais, tem roupa a menos, a televisão está muito alta, põe mas é a televisão mais alta, precisa que se abane o berço, está muita luz, está muito escuro, é normal, não é normal. Já ouvi de tudo, das três vezes. E nunca como agora me deu tanta vontade de rir. Há alturas, claro, em que apetece correr à pedrada estas pessoas com tantas certezas. Algumas garantem que só querem ajudar, eu garanto que só chateiam e não ajudam nada. Ainda ontem, tornou a acontecer: «Não me leve a mal mas eu acho que isso é das coisas que come». Eu não levei a mal. Mas atendendo a que como coisas diferentes todos os dias, pergunto: e que tal se deixar de comer? Hum? Que tal?
Os gritos dela ecoam ao mesmo tempo que escrevo este texto e, desta vez, não há margem para dúvidas: não é eco, é mesmo ela. Vejo-lhe os bracinhos a abanar no berço, vou lá e embrulho-a na manta, dou duas voltas à casa mas a Madalena não está para se calar. O pediatra, na consulta do primeiro mês, impressionou-se com a capacidade vocal da miúda e disse aos irmãos: «Já viram como são as mulheres? Não se calam. Faça a gente o que fizer não se calam nunca.» E é isto. Dentro de uma semana vamos de férias. Cheira-me que serão as férias de Verão mais sonoras de toda a nossa vida."


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